“Dizem as escrituras sagradas: `Para tudo há o seu tempo. Há tempo para nascer e tempo para morrer´. A morte e a vida não são contrárias. São irmãs. A `reverência pela vida´ exige que sejamos sábios para permitir que a morte chegue quando a vida deseja ir. Cheguei a sugerir uma nova especialidade médica, simétrica …
“Dizem as escrituras sagradas: `Para tudo há o seu tempo. Há tempo para nascer e tempo para morrer´. A morte e a vida não são contrárias. São irmãs. A `reverência pela vida´ exige que sejamos sábios para permitir que a morte chegue quando a vida deseja ir. Cheguei a sugerir uma nova especialidade médica, simétrica à obstetrícia: a `morienterapia´, o cuidado com os que estão morrendo. A missão da morienterapia seria cuidar da vida que se prepara para partir. Cuidar para que ela seja mansa, sem dores e cercada de amigos, longe de UTIs. Já encontrei a padroeira para essa nova especialidade: a `Pietà´ de Michelângelo, com o Cristo morto nos seus braços. Nos braços daquela mãe o morrer deixa de causar medo.” Esse texto chama-se “Sobre a Morte e o Morrer”, do escritor Rubem Alves e foi publicado em sua coluna no Jornal Folha de S.Paulo. À época, o autor estava com 70 anos.
O tema do Dia Mundial dos Cuidados Paliativos de 2019, que neste ano acontece sábado (12) é “Meu cuidado, meu direito. É importante saber que toda pessoa tem direito aos Cuidados Paliativos, caso seja portadora de uma doença ameaçadora da continuidade da vida. Os Cuidados Paliativos são uma filosofia de cuidado indicada para os pacientes (crianças, adultos e idosos), e seus familiares, que enfrentam doenças ameaçadoras da continuidade da vida, desde o diagnóstico até o momento de luto dos familiares. Ao longo dessa trajetória, uma equipe interdisciplinar busca antecipar, identificar e manejar precocemente sintomas/sofrimento físico, psicológico, espiritual e social com o objetivo de melhorar a qualidade de vida, permitindo que a pessoa viva tão ativamente quanto possível até o momento da sua morte.
Desde 2013, o acesso a essa forma de cuidado é considerado Direito Humano pela Organização Mundial de Saúde e em outubro de 2018 foram publicadas as diretrizes para a organização dos cuidados paliativos no Sistema Único de Saúde (SUS).
“Você sabia que pode definir como deseja ser cuidado ao final da vida, inclusive quais tratamentos deseja ou não receber?” Esse questionamento é feito pela geriatra Gisele dos Santos, do Valencis Curitiba Hospice, que complementa: “O código de ética médica fala sobre a importância de respeitar a autonomia do paciente, ou seja, uma vez que este seja informado adequadamente sobre a doença que enfrenta, bem como o risco x benefícios dos exames e tratamentos propostos, ele pode decidir, de acordo com seus desejos, valores e crenças quais exames e tratamentos deseja ou não receber”.
Isso se aplica inclusive ao momento final da vida, no qual as medidas de suporte avançado de vida como intubação orotraqueal, ventilação mecânica, hemodiálise, ressuscitação cardio pulmonar não irão mudar o ciclo natural da doença, ou seja, independente do que seja feito a pessoa irá morrer. Nessa fase esses procedimentos são considerados desproporcionais à fase clínica da doença e potenciais causadores de sofrimento.
Nesse sentido, no ano de 2006, o código de ética médica falou sobre “ortotanásia”, permitindo que o médico limite ou até mesmo suspenda procedimentos e tratamentos que não indicados para pacientes que vivenciam a fase de terminalidade e doenças graves e incuráveis. Em 2012, reconhece o Testamento Vital ou Diretiva Antecipada de Vontade como direito do paciente, sendo esse definido pelo Conselho Federal de Medicina como: “o conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade”.
Testamento vital ou Diretiva Antecipada de Vontade?
O Testamento vital ou Diretiva Antecipada de Vontade é um documento no qual a pessoa irá compartilhar seu posicionamento quanto às suas necessidades pessoais, emocionais, espirituais e médicas de acordo com os seus valores, desejos e crenças. No Brasil, ele não precisa ser registrado em cartório, basta entregar uma cópia para o médico (que presta o atendimento) e outra para um familiar e/ou para um procurador em Saúde.
“Escrever esse documento é um processo lento que envolve conversas com seu médico para compreender melhor a doença que você enfrenta e sobre o risco x benefícios dos exames e tratamentos e também conversa com os familiares e amigos, reflexão, registro por escrito/áudio/vídeo e divulgação ou compartilhamento do documento final. Para tanto, algumas perguntas podem ajudar a sua reflexão, como: Quais são os seus valores, desejo e crenças?; Quanto você quer participar das decisões do meu tratamento?; Quanta informação seus familiares podem saber?; Quanto seus familiares podem participar dessas decisões; O que deseja para seu fim de vida? O que faz sua vida valer a pena?; Para você é mais importante quantidade de vida, independente de quanto sofrimento tenha que enfrentar?; Para você é mais importante qualidade de vida, mesmo que isso signifique viver menos tempo?; Quais são seus objetivos de vida?; Onde você quer estar nos últimos dias da sua vida? Como é esse lugar? Quem estará lá com você?; Quem deve tomar as decisões sobre os seus cuidados quando você não puder decidir?; Que tipo de tratamento médico deseja ou não receber; Qual nível de conforto quer ter?; Como quer que as pessoas te tratem?”
Existem disponíveis alguns questionários que podem auxiliar na reflexão sobre como você deseja ser tratado. São eles:
1 – Conversation Project – https://theconversationproject.org/wp-content/uploads/2017/06/ConversationProject-ConvoStarterKit-Portuguese.pdf
2 – Five Wishes – https://fivewishes.org/shop/order/product/five-wishes
3 – Go wish cards – http://www.gowish.org/
4 – Cartas na mesa – http://sbgg.org.br/projeto-cartas-na-mesa/
5 – POLST – http://polst.org/
Outro site com informações sobre o assunto é testamentovital.com.br e o rentev.com.br.
É importante no documento definir quem será o representante legal (procurador em saúde), ou seja, quem irá tomar as decisões por você caso esteja incapaz de tomá-las. Saiba algumas características que o representante deve ter:
. Conhecer seus desejos;
. Ser capaz de advogar em seu favor;
. Morar perto;
. Estar disponível;
. Estar apto para a função.