No momento do fim da vida, crença pode ganhar um grau de importância e ajudar o paciente a encarar a realidade Quando pensamos em espiritualidade, podemos retomar a ideia trazida por Rubem Alves de que as coisas no mundo são de duas ordens: as que existem existindo e as que existem não existindo. As primeiras são …
No momento do fim da vida, crença pode ganhar um grau de importância e ajudar o paciente a encarar a realidade
Quando pensamos em espiritualidade, podemos retomar a ideia trazida por Rubem Alves de que as coisas no mundo são de duas ordens: as que existem existindo e as que existem não existindo. As primeiras são aquelas tidas como fatos, incontestáveis, quando vemos uma cadeira sabemos que ela existe. Já o segundo tipo são aquelas que mesmo não tendo como provar sua existência de forma palpável, sabemos que estão lá por causa do efeito que causam, como é o caso de um buraco negro, por exemplo, sua existência pode ser comprovada pelos efeitos que ele causa no cosmo ao seu redor.
“Quando se fala em espiritualidade, algo que não se vê, não se pega, não se comprova, como sabemos que existe? Acredito que é pelos seus efeitos e rastros deixados em nós. Tê-la é o que nos diferencia dos outros animais, somos a única espécie que questiona o motivo de nossa existência e os rumos de sua experiência, nos alimentamos daquilo que não existe”, fala Ronny Kurashiki, psicólogo do Valencis Curitiba Hospice.
Vale ressaltar a importante diferença entre espiritualidade e religião, pois não necessariamente uma acompanhará a outra. A primeira diz respeito a questões existenciais de forma ampla, já a segunda pode vir a ser um dos meios utilizados pelas pessoas para dar sentido à primeira. “É possível que os significados para a espiritualidade sejam encontrados de outras formas como rituais, preces, meditação, arte, contato com a natureza, relacionamentos amorosos e tantas outras formas”, elucida Ronny.
De acordo com o profissional, como a espiritualidade está ligada à existência como um todo, nem sempre ela vai aflorar somente nos últimos dias de vida, porém, é preciso reconhecer que ao se defrontar com uma doença grave e o próprio risco de morrer, é possível sim que essas questões ganhem um maior grau de importância para o sujeito. “Isso porque ao adoecer é possível que a pessoa passe por diferentes perdas, seja de sua identidade ou do próprio sentido de viver, o que por sua vez pode inaugurar um sofrimento espiritual.”
Em relação a este sofrimento, por ser uma experiência individual, é preciso que o próprio sujeito guie os caminhos que visem amenizá-lo. O que é importante é não ter ideias preconcebidas, mas permitir a autonomia e protagonismo do paciente mesmo em meio à sua possível fragilidade emocional. Assim, se fazem mais importantes a escuta e o respeito à opinião daquele que sofre do que ter sempre a resposta “certa” a dar. “A forma como o paciente em final de vida experienciará sua espiritualidade pode ser muito diferente de um para outro, por isso nem sempre o paciente nesse estágio pedirá perdão por erros passados ou mesmo tentará se reconciliar com pessoas com que tem conflitos”, comenta Ronny.
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Se for esse o caso, o profissional psicólogo, em conjunto com os demais membros da equipe, propiciará as melhores condições para que isso ocorra. No entanto, não sendo esta uma demanda do paciente, será trabalhada a questão com a família de forma a compreendê-la. “O sentimento de ‘paz’, que é como comumente se denomina o estado da pessoa que está bem com sua espiritualidade, é um caminho que será trilhado no ritmo e percurso singular àquele paciente, e isso tem algo de sagrado, no sentindo de que merece profundo respeito”, explica Ronny.
Para que seja possível manejar de forma adequada essas questões quando elas se fazem presentes, é necessário que compreender que a espiritualidade é universal e está disponível para todas as pessoas, cabendo à família e à equipe ouvir, respeitar e cuidar.
Fonte: Revista VIVER Curitiba